sábado, 21 de agosto de 2010

Dos tristes olhares



Um metro e quarenta no máximo.

Pele amarronzada, cabelo pixaim bagunçado, com alguns enfeites coloridos em sua cabeleira deixando transparecer um aspecto infantil. Nem sei se a intenção daqueles enfeites era para deixa-la mais bela ou se era só para prender os cabelos que insistiam em balançar com as ondas do vento. Mas eles, de coloridos que eram, se destacavam por alguma razão.

Mãos para traz, com roupas sujinhas e um pouco rasgada. Blusa verde, saia curta e roxa. Seus ombros estavam encurvados, sua cabeça inclinada para a direita, e suas pernas, remexiam num ar de inquietação.

Gente circulando aos montes.

Ela atirava um olhar desconfiado. Ou seria um olhar de medo? De vergonha?

Sei que de tão intensos que eram, de tão fortes os sentimentos que haviam naqueles dois pequenos olhos, que se encontravam meio que perdidos por entre a confusão de um momento sórdido, aquele olhar amarrozado e confuso me estremeceu. Nunca a tinha visto,e me arrependo de não ter perguntado o seu nome. Porque o seu olhar em vez de estar visualizando alguma coisa, gritava (e parecia gritar para mim). E era um grito de desespero e de incomodo. Poderia eu descrever a agonia e a essência destes dois olhinhos fundos e sofridos? (É claro que não!)

Era apenas os olhos de uma menina. Que por certo, queria brincar, correr, estudar, conversar com suas amigas. Mas que violentamente estava sendo roubada. Roubada, em todos os seus aspectos de menina, de criança. Seus olhos agora, só poderiam expressar aquilo que via: Abuso, violência, julgamentos. Podridão.

O que mais ela poderia contemplar?

Sua pureza infantil não estava mais ali. Sua vergonha estava, sua dor estava, e sua miséria ardia.

E era apenas uma menina.


Escrito após uma estúpida e triste cena de abuso sexual infantil na cidade de João Pessoa. Meus olhos estão molhados, de raiva, de dor, de impotência, de amargura, de compaixão. Mas nem de longe, é um olhar igual a daquela menina que gritava com os olhos e que se calava com todo o seu corpo.

3 comentários:

Fred Caju disse...

Bem forte. As palavras construíram uma imagem tristemente real.

Anônimo disse...

É engraçado quando a realidade nos é mostrada, assim, sem querer. A gente sabe que ela existe, mas preferimos não catucá-la e deixá-la ali de lado para não nos incomodarmos.
Foi oq aconteceu com vc. Casos como esse acontece a cada pausa entre uma respiração e outra sua. Sempre existiu e talvez sempre existirá porque ela é uma dessas reralidades que preferimos não catucar. Mas fique tranquila, com o tempo vc cansará de se indignar com isso e voltará a comer seu delicioso café da manhã como sempre e só lembrará disso novamente quando passar pelo local onde tudo foi visto.



xêru meu bem!

Letícia disse...

Walmete...

recebi dois conselhos esta semana: um me dizia após eu ter perguntado o que fazer para não sentir mais um nó na garganta (após a tal cena) a seguinte coisa: não queira nem tão cedo tirar este nó de sua garganta, pq ele ñ deixará que você continue sendo como as demais pessoas que aos montes estão por aí, desumanizadas.

o outro dizia o seguinte: "“Transforme o seu ódio e amor em luta!” E quando você for tomar um café da manhã, não aceite os conselhos do esquecimento, aceite os conselhos da lembrança. Não para ficar triste, mas para lembrar que outros poderiam estar no seu lugar e deveríamos ser iguais assim como a Natureza (Deus) maravilhosa nos colocou neste mundo. "

Por mais que eu te adore, minha amiga,walmete, prefiro ficar com estes dois conselhos ^^

abraço!

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bem assim